O recente manual da Associação Americana de
Psiquiatria gerou grandes discussões entre os experts sobre o que difere
uma emoção normal de um transtorno. Mas, afinal,o que isso tem a ver
com sua saúde?
O mês de maio marca o lançamento da
quinta edição do Manual de Diagnóstico e Estatística de Doenças Mentais,
conhecido pela sua sigla em inglês: DSM-5. O documento, uma iniciativa
da Associação Americana de Psiquiatria, reúne cerca de 300 distúrbios,
todos com definições baseadas em sintomas detalhadíssimos. Uma análise
simplista diria que, com descrições tão específicas sobre cada problema,
o livro dispensaria a necessidade de um especialista — basta verificar
se você se enquadra em determinada chateação e, aí, realizar o
tratamento indicado. Até por isso, o guia vem sendo apelidado por muita
gente de a bíblia dessa área da medicina.
“Mas, que fique
claro, o DSM está longe de ser uma bíblia, e o simples fato de estarmo
diante da sua quinta versão prova isso”, rebate o psiquiatra Antonio
Geraldo da Silva, presidente da Associação Brasileira de Psiquiatria.
“Como nas edições anteriores, essa traz itens polêmicos que de forma
alguma devem ser vistos como verdades absolutas no consultório médico”,
alerta.
Sem dúvida, a diretriz está dando o que falar. O
alvoroço gira ao redor da definição de novas doenças e do, digamos,
afrouxamento de critérios para diagnosticar uma série de males. De um
lado, críticos afirmam que essa postura deixará cada vez mais tênue a
linha que diferencia uma emoção natural de uma patologia. “Se seguirmos o
que está escrito no DSM-5, o luto se transformará em depressão, o
esquecimento em comprometimento cognitivo leve, a birra das crianças em
desregulagem perturbadora de humor, e por aí vai”, argumenta o
psiquiatra Allen Frances, da Universidade Duke, nos Estados Unidos. Há
quem aponte inclusive que as alterações visam enriquecer empresas
farmacêuticas — um estudo da Universidade de Massachusetts, também nos
Estados Unidos, sugere que em torno de 70% dos profissionais diretamente
envolvidos com a criação do manual estariam ligados a essas indústrias.
Na
contramão, defensores da obra alegam que os ajustes e o maior número de
enfermidades são fruto de artigos científicos sérios e da própria
modernidade. Não dá para negar que a vida hoje em dia é diferente da de
décadas atrás e, portanto, está sujeita a piripaques antes inexistentes
ou pouco percebidos. “Fizemos mudanças conservadoras. O objetivo foi
delinear com precisão desordens mentais que têm um impacto real nas
pessoas, não elevar o número de diagnósticos”, garante David Kupfer,
chefe da força-tarefa que elaborou o DSM-5.
“A psiquiatria
americana saiu, muitos anos atrás, do extremo da subjetividade para
aterrissar, hoje, no ápice da objetividade. E o DSM-5 reflete essa
tendência”, raciocina Paulo Jannuzzi Cunha, neuropsicólogo do HC. O medo
é que, ao se concentrar demais em sintomas e pouco na biografia do
sujeito, os experts acabem receitando fármacos além da conta. “A maioria
dessas drogas traz efeitos colaterais”, destaca Márcia Maria de Souza,
farmacologista da Universidade do Vale do Itajaí, em Santa Catarina.
“Certos antidepressivos, por exemplo, às vezes provocam problemas
intestinais e cardiovasculares, sonolência, impotência...”, enumera.
Contudo,
não é um livro que, sozinho, decide o futuro de alguém. “Ele dá uma
base, porém é o acompanhamento do indivíduo ao longo do tempo que mais
aumenta a chance de sucesso no diagnóstico e na terapia”, esclarece
Antônio Egídio Nardi, psiquiatra da Universidade Federal do Rio de
Janeiro. Ao sentir que precisa de ajuda, vá atrás de um bom médico e
confie nas decisões dele, sem pressioná-lo por resultados imediatos.
O nosso guia oficial Nos
Estados Unidos, o DSM-5, fora direcionar os clínicos, serve de base
para as empresas de seguro de saúde cobrirem gastos médicos. Esse
documento não tem tamanha força em território verde e amarelo. “As
diretrizes seguidas pelas seguradoras e que mais influenciam na prática
do psiquiatra no Brasil são as presentes na Classificação Internacional
de Doenças, a CID, da Organização Mundial da Saúde (OMS)”, diz Silva.
Como
já mencionamos nesta reportagem, o DSM-5 define problemas mentais
diversos de acordo com uma série de sintomas. “Entretanto, no futuro não
vai ser assim”, aposta Jair Mari. “Acredito que descobriremos
alterações visíveis no cérebro decorrentes de problemas mentais e,
então, traçaremos os diagnósticos também a partir delas, apoiados em
exames de imagem”, especula.
A alegação está longe de ser
infundada, porque a neurociência traz cada vez mais detalhes sobre como a
massa cinzenta funciona. “Acontece que nossa cabeça é muito complexa e
revela seus segredos aos poucos. Essa revolução é excitante, mas temos
um longo caminho pela frente antes que ela chegue aos consultórios
médicos”, contextualiza Allen Frances. Está aí a razão pela qual o DSM-5
não abordou o tema dos exames de imagem, embora tenha, sim, ocorrido
debate sobre ele durante sua feitura. Mas — olha que curioso —
há uma seção inteira apenas sobre condições a serem estudadas a partir
de agora para eventualmente conquistarem sua vaga definitiva em uma
edição atualizada. “Trata-se de um documento vivo, e isso é bastante
favorável”, diz Antonio Geraldo da Silva. Entre as moléstias colocadas
no limbo está o vício por jogos de internet (veja na tabela à direita
essa e outras pendências abordadas). “Isso mostra como o DSM-5 não pode
ser a única fonte de referência de um psiquiatra”, declara Silva. “Se um
paciente chegar ao meu consultório com indícios de não conseguir parar
de mexer no computador, eu não esperarei a nova versão desse manual para
intervir”, arremata.
Em outras palavras, o foco de todos
precisa mirar a busca pelo bem-estar. Dessa maneira, os especialistas
tirarão o melhor de qualquer manual — em vez de encará-los como uma
tábua de mandamentos — e você assegura a paz com sua mente e suas
emoções.
Males que talvez sejam incluídos na próxima edição do DSM Síndrome atenuada da psicose: seria um estágio anterior do transtorno. Tratar cedo evitaria os surtos. Será? Automutilação não Suicida: há evidências do quadro, porém o assunto carece de pesquisas. Desordem do uso de jogos na internet: como se trata de uma encrenca relativamente recente, optou-se por estudar mais sobre ela.
Acompanhe as próximas postagens de continuação. Serão 05 assuntos. (Compulsão Alimentar, Sexo, TDAH, TOC, Simples Esquecimento?)
O Dr Antônio Geraldo é presidente do Instituto de Psiquiatria Antônio Geraldo.
Médico Psiquiatra - CRMDF-5875.
Presidente da Associação Brasileira de Psiquiatria. Tesoureiro da Associação Psiquiatrica de Brasília.
Diretor da Associação Médica de Brasília. AMBr/ AMB.
Diretor Adjunto do SINDMÉDICO / FENAM - DF.
Professor da Universidade Estadual de Montes Claros - UNIMONTES.
0 comentários:
Postar um comentário