terça-feira, 12 de janeiro de 2010

CFM altera composição da Câmara de Psiquiatria

segunda-feira, 11 de janeiro de 2010

Especialistas defendem os medicamentos e explicam como age a Depressão

Pesquisa inglesa critica o uso de antidepressivos em casos “leves e moderados”, e agrava a confusão feita em torno do tema. Especialistas defendem os medicamentos e explicam como age a doença

Correio Braziliense





A depressão é um transtorno causado por alterações químicas no cérebro. Uma tristeza, aparentemente súbita, toma conta da mente e impede a realização de tudo o que estabelecemos como metas para o bom funcionamento da vida. Os sintomas, muitas vezes, são facilmente confundidos com frustrações banais, é verdade. Mas a falta de informação faz o mal ser alvo de preconceitos e interpretações equivocadas.

Enquanto erramos no diagnóstico, a doença não pára de crescer. Segundo dados da Organização Mundial de Saúde (OMS), a depressão afeta 120 milhões de pessoas no mundo e é a quarta enfermidade mais incapacitante, de acordo com estudos feitos em 1996. Pior: no ano de 2020 já será a segunda, perdendo apenas para doenças isquêmicas do coração.
Nesse mundo que ainda mistura avaliações apressadas e informações desencontradas, uma pesquisa publicada pela Universidade de Hull, na Inglaterra, pôs em questão o uso de antidepressivos no tratamento da doença. De acordo com o estudo, esses medicamentos não seriam eficazes em casos leves e moderados. Especialistas discordam. “A depressão é uma doença só, não três. Casos leves, moderados e graves se diferenciam apenas por alguns sintomas. Essa subclassificação é mesmo questionada por muitos pesquisadores”, explica o psiquiatra e professor da Universidade de Brasília (UnB) Raphael Boechat.

O psiquiatra Ricardo Moreno, que é pesquisador do grupo de doenças afetivas do Hospital das Clínicas, em São Paulo, também implode o estudo e ressalta: “A pesquisa apresenta muitas falhas metodológicas. A conclusão é um desserviço para pacientes que sofrem de casos mais brandos, já que, sem tratamento, eles têm grandes chances de passarem por crises mais graves”.

Autora do livro Eu tomo antidepressivo, graças a Deus!, a jornalista e escritora Cátia Moraes sofre do mal e juntou em sua obra várias experiências de quem passou pelo problema. “A depressão leve é chamada assim porque não paralisa totalmente a pessoa, mas a qualidade de vida dela se deteriora rapidamente”, conta.

Para Ricardo Moreno e Cátia Moraes, pesquisas como essa são aceitas por causa do receio e preconceito em torno do uso de antidepressivos. Para eles, essa falta de aceitação é um grande entrave no tratamento de quem sofre do mal. Segundo Moreno, uma em cada cinco pessoas terá pelo menos um episódio de depressão ao longo da vida. Dessas, apenas um terço procura um psiquiatra. Os outros dois terços vão atrás de tratamentos alternativos. O que é preocupante, já que 18% dos casos de depressão são crônicos e, sem o uso da medicação preventiva, voltarão a ocorrer ao longo da vida de maneira cada vez mais acentuada e incapacitante.

Os médicos ressaltam, no entanto, a necessidade de se diferenciar a tristeza profunda da patológica. Estar sofrendo não é o pré-requisito para o uso dos antidepressivos. Frustração faz parte da vida. Além disso, se não for depressão, os remédios não farão efeito. “A depressão é uma alteração de neurotransmissores. Não é questão ideológica”, explica o psiquiatra Ricardo Moreno. Apesar de o antidepressivo não causar dependência como os calmantes — por isso é um remédio considerado tarja vermelha, não preta —, os mais de 30 tipos têm efeitos colaterais e precisam ser controlados por um psiquiatra para que sejam realmente eficazes.


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Dúvidas freqüentes
• Tristeza não é depressão, como explica o psiquiatra Raphael Boechat: “A doença apresenta uma série de sintomas, a tristeza é um deles, mas estão presentes vários outros, como alterações do sono e do apetite, humor deprimido, diminuição do desejo sexual, alterações de concentração, idéias suicidas. Além disso, a duração é maior do que de uma tristeza causada por circunstâncias da vida”.
• O uso de antidepressivos para escapar das frustrações cotidianas é um risco para quem usa, além de não ser eficaz em quem não sofre da doença. Mas o medicamento não causa dependência. Há a possibilidade de efeitos colaterais graves, e a combinação com o uso de outros remédios pode alterar o funcionamento de ambos. A pílula anticoncepcional perde sua eficácia, por exemplo.
• A incidência de depressão é maior nas mulheres do que nos homens. “Isso pode ser em decorrência das alterações hormonais pelas quais a mulher passa ao longo da vida”, explica o psiquiatra Ricardo Moreno.
• O fator genético tem forte influência no aparecimento da depressão. Duas em cada cinco pessoas que sofrem com a doença têm outros casos na família.

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Medo e angústia extremos

Alvo de preconceito até por aqueles que sofrem do transtorno, a depressão causa polêmica por ser um mal afetivo, que mexe com os sentimentos e com a capacidade de relacionamento. A jornalista e escritora Cátia Moraes conta que, além de sofrer de depressão, teve o primeiro contato com o transtorno quando seu pai entrou em crise. “Ele era uma pessoa muito querida, gostava de declamar, era amoroso, um paizão. De repente, quando tinha 11 anos, perdi o meu pai, que passou a ficar o tempo todo deitado na cama. Ele perdeu o emprego, e acabou falecendo quatro anos mais tarde”, conta.

A falta de abertura para falar a respeito dificultou a compreensão sobre a doença. “Não dava para entender e ninguém comentava, o preconceito era maior ainda naquela época. Era muito ruim. Era uma família tão unida e saudável, que de repente foi tomada pelo medo”, diz Cátia Moraes. Ela se viu novamente confrontada com a depressão quando começou a sentir os sintomas aos 37 anos. “Era um medo e uma angústia extremos, foi horrível.”

Em depoimento no livro Eu tomo antidepressivo, graças a Deus!, a jornalista Ciça Guedes conta que, numa crise depressiva, teve um pavor súbito e arrebatador de comer e beber. Ela passou a sentir pânico de ingerir líquidos e engolir comida, acreditando que poderia se engasgar. Só depois de alguns dias de uso de medicamentos aliados à terapia, conseguiu voltar a tomar pequenos goles e comer. A depressão é assim. Pode minar relacionamentos e tomar conta de seu poder de decisão, seu raciocínio e mesmo da sua vontade de viver.

É em casos como esses — ou para evitá-los — que os remédios são indicados. E sempre aliados a outros tratamentos: normalmente a psicoterapia. Diferentemente dos médicos de algumas décadas atrás, os psiquiatras de hoje acreditam na necessidade de combinar a terapia com o uso de antidepressivos. “Sendo a depressão um problema multifatorial, ou seja, que tem várias causas, o tratamento também deve ser múltiplo”, compara o psiquiatra Ricardo Moreno.
LEVANDO A PÚBLICO

Cátia Moraes

A jornalista escreveu um artigo em resposta a uma reportagem que atacava o uso de antidepressivos. A repercussão foi tanta que ela revolveu escrever um livro sobre sua experiência pessoal, assim como a de seu pai, que morreu em decorrência da doença.

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Antônio Calloni

No livro Eu tomo antidepressivo, graças a Deus!, Calloni revelou que quando começou a sentir os sintomas da depressão, ele não entendeu o que estava acontecendo. Foi ao psiquiatra, fez terapia e tomou antidepressivo, mas parou três meses depois. Teve, então, uma recaída, e diz que, desde então, segue à risca as indicações de seu médico.

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Cássia Kiss

A atriz foi capa de revista e deu várias entrevistas sobre o fato de sofrer de transtorno bipolar — um tipo de depressão marcado por duas fases distintas, uma depressiva e outra de euforia ou mania —, além de bulimia. Ela disse que, como para muitos que admitem, falar a respeito de sua doença trouxe um grande alívio.

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Trecho do livro Eu tomo antidepressivo, graças a Deus!
A partir dos sete anos, um mundo de B. se reduziu a uma palavra asfixiante: medo, que muitas vezes se transformava em desespero e recaía sobre seus pais e irmão. Os pais tentaram a homeopatia e B. freqüentou semanalmente as sessões de terapia, mas não conversava com a psicóloga. Quando B. começou a engordar, a mãe a levou a um endocrinologista. Ele deu o diagnóstico: “Já passou da hora de vocês levarem a B. a um psiquiatra, ela não pode entrar assim na adolescência”. O médico alertou que eles tinham que rever o preconceito em relação aos antidepressivos. B. foi levada a um psiquiatra três anos depois do início dos sintomas. Pela primeira vez, falou o que sentia. O psiquiatra deu informações sobre a depressão, o tratamento e disse que ia lhe receitar um remédio. Ela perguntou se era para ‘tirar o medo’. Ele explicou que era para ajudá-la a enfrentar aquele medo. Ela concordou. Foi medicada e a mudança não tardou. Três meses depois, ela já falava de tudo com espontaneidade. “Teve um dia que contei tudo para as minhas amigas. Falei do tratamento, do remédio, dos meus medos, e elas me disseram que sentiam a mesma coisa. Aí falei para minha mãe que eu não sou tão diferente das outras garotas”, diz B.
Psicoterapia
É considerada fundamental na melhora do quadro depressivo. Mas sempre combinada com o uso de medicamentos. “Um erro comum é iniciar a psicoterapia e, se não melhorar, partir para o uso dos antidepressivos. Isso pode agravar o caso, além de demorar muito tempo para ajudar”, alerta o psiquiatra Raphael Boechat.

Medicamentos antidepressivos
Atuam diretamente nos neurotransmissores responsáveis pela sensação de felicidade e bom humor. Há mais de 30 substâncias diferentes. Todas têm efeitos colaterais em maior ou menor proporção, que vão de boca seca e insônia a crises convulsivas.

Terapia de luz
Sessões de exposição à luz artificial ou solar são usadas para diminuir a tristeza excessiva. Está comprovado que a falta de luz altera o humor. O uso dessa terapia, no entanto, não é unânime e alguns especialistas indicam que não há estudos suficientes sobre o assunto.

Eletroconvulsoterapia (ECT)
Também conhecido como eletrochoque, o polêmico tratamento consiste em usar choques de 90 a 110 volts para restabelecer o bom funcionamento do cérebro. Apesar do estigma, especialistas são a favor, e explicam que é a única saída para alguns transtornos e casos mais severos, com alto risco de suicídio.

Estimulação magnética transcraniana
Terapia que substitui o eletrochoque. Ela consiste no uso de um campo magnético aplicado por meio de uma bobina. É um processo indolor e que não causa desconforto nem convulsões, suas principais vantagens sobre a ECT.


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Fontes: Raphael Boechat e Ricardo Moreno, psiquiatras

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ESPERANÇA RENOVADA

Os psiquiatras trabalham com uma nova tese para tratar a depressão: alteração no ritmo circadiano ou relógio biológico. O médico João Romildo Bueno, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), explica que parte dos pacientes com crise depressivas tem distúrbios do sono, como sonolência persistente, insônia ou dificuldades para dormir. O tema foi um dos destaque do 4º Congresso Brasileiro de Cérebro, Comportamento e Emoções, realizado há duas semanas, em Bento Gonçalves (RS).

O ciclo ou ritmo circadiano consiste no período sobre o qual se baseia a harmonia biológica do ser vivo. Para os seres humanos, esse tempo corresponde a aproximadamente 24 horas e é influenciado de forma marcante pela exposição à luz solar. Por meio desse ciclo, ocorre a regulação de todos os ritmos biológicos e psíquicos do corpo, como o processo de digestão, a sucessão sono–vigília e a regulação da temperatura orgânica.

O psiquiatra Antônio Geraldo, presidente da Associação de Psiquiatria de Brasília, ressalva que mais estudos devem ser efetuados a fim de consolidar os achados obtidos até agora. Entre as pesquisas está o primeiro antidepressivo melatoninérgico, específico para tratar as alterações do ritmo biológico. A substância ainda está em fase de licenciamento nas agências reguladoras de medicamentos na Europa e nos Estados Unidos e não há previsão para a sua chegada ao mercado farmacêutico. “É um passo importante. Os medicamentos existentes podem interferir ou mesmo piorar o padrão de sono dos pacientes deprimidos, pois interferem no ciclo circadiano”, avalia Antônio Geraldo.

________________________________________Colaborou Maria Vitória

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