Antônio
Geraldo da Silva, psiquiatra: 'O pai do estigma se chama Hollywood'
Estudioso da psicofobia (pânico de doenças mentais),
mineiro, que mora em Brasília e preside associação da classe, veio ao Rio a
trabalho
POR LEONARDO CAZES
Segundo o presidente Associação Brasileira de
Psiquiatria, Antonio Geraldo da Silva, só no Brasil 50 milhões de pessoas com
algum tipo de transtorno mental - Pedro Kirilos / Agência O Globo
“Nasci em Grão Mogol, no interior de Minas Gerais, há 51
anos, passei a maior parte da vida em Montes Claros e atualmente moro em
Brasília. Sou casado, tenho uma filha e faço doutoramento em psiquiatria na
Universidade do Porto, em Portugal. Estou no meu segundo mandato à frente da
Associação Brasileira de Psiquiatria”
Conte
algo que não sei
Vou contar o que é psicofobia. Há milêniosexiste um
grande preconceito contra doenças mentais. Várias pessoas foram queimadas em
fogueiras porque ouviam vozes. Sempre foram segregadas, vistas como fardo.
Qual
o tamanho desta população tão estigmatizada?
Só no Brasil temos cerca de 50 milhões de pessoas com
algum tipo de transtorno mental. No mundo, um bilhão. Em geral, ninguém sabe,
nem os doentes, que escondem sua condição e ignoram que podem se tratar.
Por
que números tão altos?
O estresse hoje em dia é um grande facilitador da doença
mental, atuando em tendências preexistentes. Você dorme pouco, come mal, não se
exercita e vive sob uma pressão brutal. Cinco das dez principais causas de
afastamento do trabalho são relacionadas a transtornos mentais.
O
ambiente de trabalho é hostil ao doente mental?
As pessoas não toleram que as outras mudem e que tenham
perdas de produção. Aí dizem que é só preguiça, falta de vontade e até de
caráter. Quem tem transtorno do déficit de atenção com hiperatividade (TDAH)
sofre um preconceito monstruoso.
O
que ocorre, no caso?
Virou moda dizer que essa doença não existe, que é
inventada. Acontece que tem dois mil anos. Quero saber quem conheceu esse cara
que a inventou.
Há o
próprio preconceito do doente, não?
Tem o autopreconceito: “Não vou procurar um psiquiatra,
não sou louco”. Só que isso muda completamente o prognóstico da doença, ela se
torna crônica. O que mais queremos hoje é a intervenção precoce. Estimular uma
mudança de comportamento aos primeiros sintomas para que nem seja preciso
entrar com medicação. Claro que há casos em que ela é indispensável desde o
início.
Quais
são esses primeiros sinais das doenças?
Há várias possibilidades dependendo de qual doença.
Tristeza, desânimo, falta de prazer, de alegria, em geral é depressão. Se o
coração dispara, tem sensação de sufocamento, é transtorno de pânico. E assim
em uma série de situações. Quando há modificações de hábitos ligados a
instinto, como sono e apetite, tem que cuidar.
O
medo do desconhecido explica o preconceito?
Sim. As pessoas acham que é perigoso porque não sabem do
que se trata. Então é melhor separar, discriminar. Fizeram isso com os
hospitais psiquiátricos. Por que não há unidades de psiquiatria no hospital
geral? Porque ninguém quer doente mental dentro do hospital.
Por
que o senhor escolheu a psiquiatria?
Porque eu gosto do ineditismo e também pela possibilidade
que a especialidade dá de ajudar as pessoas que têm suas vidas destruídas por
quadros psiquiátricos a voltarem a viver. Todo dia há um fato novo na
psiquiatria. Nada se repete. E é isso que me impressiona.
Na
queda do avião alemão, logo surgiu a informação de que o piloto tinha depressão.
Isso aprofunda o estigma?
O pai do estigma, de sua difusão, se chama Hollywood. São
filmes e mais filmes que discriminam o doente. Sabe quando a pessoa tem febre,
não se consegue explicar a razão e chamam de virose? É a mesma coisa. Quando
não se tem explicação para um fato, dizem que é doente mental, e tudo se
resolve.
Leia mais sobre esse assunto em http://oglobo.globo.com/sociedade/conte-algo-que-nao-sei/antonio-geraldo-da-silva-psiquiatra-pai-do-estigma-se-chama-hollywood-16614786#ixzz3fDmCgjfd
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